Quando comecei a fazer terapia com uma psicóloga, o tema mais abordado por mim era sempre o meu filho. Quando lhe expus as minhas preocupações ou aquilo que me incomodava na forma como os outros lidavam com o meu filho, ela fez-me uma pergunta que me deixou a pensar durante alguns dias. “Fez o seu luto?”. Disse-me que quando a mulher engravida cria uma expectativa sobre o seu próprio filho, imagina cenários, idealiza situações que até podem ser do dia a dia, por exemplo:
“Quando o meu filho começar a saltar e a correr por todo o lado, a jogar à bola.”
“E já pensaste quando ele quiser ir para a dança?”
“A quantidade de amigos que vai ter.”
Explicou-me que muitas vezes, esta idealização ou expectativa é totalmente inconsciente. Depois de refletir sobre este assunto cheguei a conclusão de que, apesar de nunca ter idealizado nenhum cenário específico, também nunca pensei “E se ele for autista?”. Mas porque é que não pensei nisto? Era esta a pergunta que mais pairava na minha cabeça. Talvez porque primeiramente não tinha conhecimentos, básicos sequer, sobre o autismo e depois fiquei a pensar, no porquê de muitas vezes não se assumir que esta pode ser uma realidade.
Desde cedo soube que havia alguma coisa diferente no meu filho. E quando soube do seu diagnóstico tinha duas opções, aceitar e ser proactiva, ou entrar em negação e ficar a sofrer, o que não seria, no meu ponto de vista, benéfico para ninguém.
Não sei como é com vocês, mas quando soube do diagnóstico do meu filho deixei de criar expectativas a longo prazo. Vivo um dia de cada vez, celebro as suas vitórias e ajudo-o a construir o seu caminho, tentando que se torne cada vez mais autónomo. Também sei que muitos pais não pensam assim, que pensam no “daqui a 10 ou 20 anos”, o que também é legítimo, mas na minha cabeça só cabe um dia de cada vez.
Se é sempre fácil? Não. Não é fácil ver os seus recuos, ver a sua “aparente” perda de aquisições, não é fácil ter que recorrer a medicação, não é fácil muita coisa. Não é fácil gerir estas emoções e ainda tudo o que se vai passando ao longo dos nossos dias, como cuidar de outros filhos, gerir uma casa, empregos, relações… Mas também há muitos lados positivos. Eu, por exemplo, aprendo todos os dias com ele, pela forma como olha para o que o rodeia, para as pessoas. Aprendo com a sua sensibilidade e com a sua atenção ao detalhe.
Temos que nos adaptar, porque esta é a nossa vida. Se temos uma rotina comum? Temos a rotina necessária. Prescindimos de algumas coisas, mas tentamos compensar com outras. Cada família tem a sua dinâmica, com ou sem crianças com alguma neurodiversidade.
Não fiz luto, porque não perdi nenhum filho, este é o meu filho, assim como é, porque se fosse diferente não seria ele, não seria meu. E tenho a certeza apenas de uma coisa, que ele será o que ele quiser, quando e como quiser. E que eu estarei aqui, sempre.
Rita
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